27 de jan. de 2014

Após seis meses de seu início, Programa Mais Médicos muda a rotina dos postos em Sergipe

Por Alice dos Santos Silva e Aucicláudia de Jesus Santana

Na sexta-feira, 17 de janeiro, o governo lançou o edital para a quarta fase do Programa Mais Médicos e em fevereiro deste ano, com a chegada de outra leva de médicos, a terceira fase terá início. Este programa foi uma iniciativa do governo federal para a melhoria do atendimento aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), com objetivo de melhorar as condições da saúde no Brasil, tanto em equipamentos como levando novos médicos para regiões mais necessitadas.
Sergipe recebeu 78 profissionais do Programa, que começou em julho do ano passado, e conta com médicos cubanos e alguns brasileiros que prestam atendimento básico em cidades do interior e periferias da Grande Aracaju.
A segunda chamada do Programa Mais Médicos trouxe para o município de Macambira - a 58 km de Aracaju - dois médicos cubanos. Estes prestam atendimento na clínica de saúde da família Raimunda Ribeiro dos Santos (conhecida localmente como Clínica Dona Casula).  A recepcionista,  Ivaneide dos Santos, funcionária há dois anos, foi nosso primeiro contato no posto. Ela contou que a vinda dos médicos trouxe melhoras para o atendimento, pois os médicos moram na cidade e assim podem passar o dia inteiro na clínica. Com relação aos pacientes ela afirma que até agora “a população está gostando, no começo ficaram preocupados apenas com a questão da fala, mas a comunicação flui normalmente, o espanhol deles é bom de entender” afirma. A enfermeira do posto não quis dar entrevista, pois havia acabado de voltar de licença e ainda não se sentia segura para explanar sobre o seu contato com os cubanos.

Cubano solidário

Após o atendimento aos pacientes do turno matutino, o clínico geral cubano Vladimir Pelegrim Gonzalez, explicou o funcionamento do Programa, que ao longo do seu desenvolvimento dará maior atenção àquelas doenças que têm cura, bem como a seu tratamento e reabilitação. Além disso, o Programa “deve diminuir todo tipo de incidência em doenças crônicas, infecciosas, parasitárias, DSTs, gravidez na adolescência e outras”conta o cubano de 38 anos.
Com relação ao que ele pode observar sobre saúde pública e condições do trabalho, Vladimir comentou que em questão de equipamentos e medicamentos, aqui no Brasil, especificamente em Macambira, a rede pública possui alguns medicamentos para serem distribuídos de graça e que as condições de trabalho são boas. O médico disse não ter tido problemas para se adaptar e que as pessoas o receberam muito bem e carinhosamente. Perguntamos se o idioma era uma barreira, mas ele disse que nem tanto, pois, estudando um pouco a cada dia pode aprender como interagir com os pacientes, “não é difícil aprender coisas como ‘bom dia’, ‘boa tarde’, ’ boa noite’, a cada dia aprendo pelo menos uma palavra nova”.
A paciente Elisiane da Silva contou que o programa trouxe benefícios para a saúde do município “porque aqui havia muita falta de médico, muita gente precisa e era necessário transportar para Itabaiana e muitas vezes também não tinha médicos e era preciso ir para Lagarto.” A única dificuldade encontrada é com relação ao idioma “só é meio difícil porque tem gente que não consegue se adaptar com o que eles falam, mas isso é questão de tempo.”

Trabalho em equipe

 O posto médico Muciano Cabral do povoado Guajará que pertence ao município de Nossa Senhora do Socorro - a 13 km da capital - recebeu as médica cubanas Yudenia Montoya Matinez e Judite Cortego. Durante uma visita ao posto, conversamos com a doutora Yudenia, que aos 38 anos e formada há quase 16 e chegou ao Brasil há pouco mais de dois meses. Segundo ela, as condições de trabalho no posto são boas, porém a falta de agentes de saúde para completar a equipe do turno vespertino tem dificultado o progresso do programa. “É preciso trabalho em equipe, pois eu sozinha não posso fazer atenção primária de saúde, não pude ainda fazer visita domiciliar, pois esta depende do controle e do planejamento feito pelo agente.” Afirmou a profissional que já trabalhou em outros países como Venezuela e Haiti. Quando perguntado sobre a questão salarial a médica, que também trabalhava com atenção primária em Cuba, não se atentou na questão de valores e apenas informou que “uma parte do salário é passada para mim outra parte é depositada lá em Cuba em uma conta para minha família.”
Já o encontro com a Doutora Judite foi bem mais inusitado. Na Sede de Socorro, à sombra de um ponto de ônibus próximo ao restaurante onde havia acabado de almoçar, ela nos concedeu uma breve entrevista, pois precisava retornar ao posto.  A médica teceu um breve comentário sobre a saúde pública no Brasil e de onde partiu sua motivação para ingressar no programa.
Ela relatou que tinha conhecimento da situação da saúde do Brasil, bem como da “necessidade e da dificuldade no atendimento da população mais carente, e decidimos vir ajudar a melhorar a sua saúde.” Ela, como sua colega, ressaltou a importância de um trabalho em equipe não só dentro do posto, mas também em outros setores da sociedade : “é muito importante para alcançar bons resultados na saúde em qualquer parte do mundo. Porque a saúde sozinha não pode fazer grandes coisas precisamos de outros setores como educação, esporte, das instituições públicas e do governo para ajudar a melhorar a condição de saúde da população da cidade.” A questão salarial não pode ser muito bem detalhada, pois quando perguntamos à Doutora Judite como ela recebia seu salário ela apenas respondeu que “o mais importante para nós não é o salário e sim a satisfação e a saúde da população”.

Estudantes são contra

Devido ao caráter controverso que o Programa Mais Médicos apresenta, vários pontos de vista podem ser observados a respeito dos prós e contras do projeto.  Entrevistamos alguns estudantes de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS) para identificar suas opiniões sobre a vinda dos estrangeiros. O estudante Silvio Freitas, de 25 anos afirma que o Programa traz benefícios para as populações carentes como, por exemplo, “os locais do interior. Mas isso não está sendo feito de forma correta, pois há bons médicos brasileiros e não há a necessidade de ‘importação’". Afirmou o estudante que cursa o quarto período, quando questionado se participaria ou não do Programa, mostrou-se indeciso e respondeu que talvez. 
O estudante Mendes Júnior, 26 anos, cursando o 1° período, afirmou que o Programa Mais médicos só seria interessante para a população se este estivesse ligado ao Revalida –  exame realizado com médicos que têm diploma no exterior para que possam atuar no Brasil.  “Não tem como saber o nível de competência de alguém sem algum tipo de avaliação”. Marcos Vinícius da Conceição, estudante do 5° período, afirma que “O governo, ao criar esse programa, quer colocar a culpa do caos na saúde pública para os ombros da classe médica. E nós sabemos que saúde é formada por várias classes de profissionais. Além de pessoas qualificadas, é necessário material, insumos, equipamentos e isso nenhum cubano irá trazer.”
 A questão do Revalida é muito cobrada pelos alunos, todos os entrevistados tocaram no assunto e se sentiram inseguros com relação à credibilidade dos médicos cubanos.  Os estudantes entrevistados também acreditam que não há concorrência de mercado entre eles e os médicos cubanos.  Por fim, Vinícius afirmou que “faz-se necessário dizer que se os médicos estrangeiros fizessem o Revalida, ficaríamos satisfeitos, afinal, mostrariam que possuem habilidades inerentes ao profissional médico.”.

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