6 de jun. de 2011

Militante estudiosa?

Aluna de jornalismo da UFS, Bárbara Nascimento rejeita o estereótipo de militante "que não quer saber de estudar, só quer criticar”

(Foto: repartircomtodos.blogspot.com)
Bárbara fala aos estudantes no Cobrecos

Por Iargo Souza

“Ocupa ou não ocupa? Resiste ou não resiste?”. Foi com este "grito de guerra" que Bárbara Nascimento de Oliveira – conhecida como Babi, personificou a indignação dos estudantes que ocuparam a Reitoria da Universidade Federal de Sergipe durante a primeira semana de junho. Ao final de uma reunião de negociação entre professores e a alta cúpula da Reitoria, Bárbara subiu ao palco, leu um poema e, ruborizada e trêmula, gritou as palavras de ordem, imediatamente respondida pelos colegas. Foi assim, com gestos enfáticos, que Bárbara puxou a retirada dos estudantes, afirmando a continuação da mobilização. Ao som de apitos, gritos e aplausos, os jovens rumaram de volta à ocupação, sob o coro de “nas ruas, nas praças, quem disse que sumiu? Aqui está presente o movimento estudantil!”

No dia 31 de maio, os estudantes de Comunicação Social da Universidade Federal de Sergipe (UFS) ocuparam a anti-sala do gabinete do reitor, em protesto contra a precarização do curso, que carece de estrutura física, equipamentos e professores. Organizados na campanha “Chega de Migalhas!”, os estudantes pediam uma audiência com o reitor Josué Modesto dos Passos Sobrinho, que só aconteceu no dia 3 de junho no auditório da reitoria, com a participação dos professores do Departamento de Comunicação, alunos do curso e outros dirigentes da instituição.

Dentre os questionamentos levantados pelos alunos, não satisfeitos com as propostas da reitoria, destacou-se o não comprometimento com a definição de prazos para a resolução das problemáticas.

Quem é ela?

Filha dos funcionários públicos Maria Luzinete Nascimento e Marçal de Oliveira Neto, Bárbara Nascimento de Oliveira, 23, está cursando o 7º período de comunicação social com habilitação em jornalismo na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Além das atividades acadêmicas relacionadas ao seu curso, a estudante é militante do movimento estudantil ligada à Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) e estagiária do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Sergipe (Sintese).

Nascida e criada em Aracaju, a jovem interessou-se pelo jornalismo ainda muito nova. A afinidade com as matérias de língua portuguesa e redação fizeram despertar o gosto pela escrita. Na 6º série, uma professora, de nome Silmara demonstrava interesse pelo que a aluna escrevia e a incentivava, chegando a utilizar um trecho de um de seus textos em uma prova. A partir daquele momento Bárbara passou a se dedicar ainda mais a escrever, levando essa relação com a comunicação até a hora de prestar o vestibular.

Começo na militância

No ano de 2006, cursando o primeiro período de jornalismo na Universidade Tiradentes (Unit), Bárbara é apresentada ao Centro Acadêmico de Comunicação Social (CACS) daquela instituição. A partir desse momento passa a participar das atividades e reuniões do centro e a se interar das propostas e bandeiras da Enecos.

Também em 2006, acontece em Salvador o XXVIII Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecom). Mobilizados, estudantes da UFS e Unit, inclusive Bárbara, vão à Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Facom) e, durante uma semana, debatem temas como a democratização da comunicação e o combate às opressões. Antes disso, participa, em Aracaju, dos pré-encontros que consistiam em realizar debates sobre as bandeiras que a Enecos defendia, sendo elas: a democratização da comunicação; o combate às opressões; discussão do machismo e como este reflete na mídia; discussão da homofobia e como a problemática é pautada pelos veículos de comunicação; a questão dos negros e negras e dos nordestinos na mídia, etc.

Durante o evento acontece um ato que marcou a entrada definitiva de Bárbara na militância. Mais de dois mil estudantes caminharam nas ruas de Salvador discutindo junto à comunidade o combate às opressões, tema do encontro. Dessa forma, quando volta à universidade, a estudante, agora militante, não consegue ver-se dissociada do movimento estudantil e passa a integrar o CACS.

UFS

No final do segundo período de 2006, Bárbara tranca o curso de jornalismo e se afasta da Unit. Apesar de estar participando das atividades do centro acadêmico, ela sentia-se insatisfeita com a política da universidade que, segundo ela, podava a liberdade dos estudantes, estabelecia regras e limites impedindo avanços. Assim, volta ao Colégio São Paulo, em Aracaju – instituição onde cursou o ensino médio – e consegue uma bolsa integral para curso pré-vestibular. Passa o ano de 2007 estudando, mas mesmo não estando ligada a nenhuma universidade continua na militância. Mantém suas atividades no coletivo Enecos-Sergipe e nesse período participa da organização do Encontro Regional dos Estudantes de Comunicação Social (Erecom), que aconteceu na UFS e contou com a participação de estudantes de Alagoas, Bahia e Sergipe. Depois do encontro continua suas atividades nas reuniões do coletivo e no fim do ano é aprovada no curso de jornalismo da UFS.

Mesmo antes de começarem as aulas na UFS ela já tinha contato com o Diretório Acadêmico de Comunicação Social (DACS), ajuda a organizar a recepção dos calouros – dela inclusive –, e entra no processo de eleição do diretório, que estava com uma coordenação provisória. A chapa “No fim a gente ganha” foi eleita no início de 2008 e reeleita em 2009, dando-lhe a oportunidade de integrar duas gestões do DACS. Nesses dois anos participou de atividades importantes como a semana de comemoração dos 15 anos do curso de Comunicação Social da UFS, em que já eram apresentados problemas relacionados à estrutura do curso, além de trazer palestrantes para discutir o movimento estudantil. No fim de 2009 a gestão se encerra, e Bárbara não mais participa da disputa de outra chapa.

Influências e formação ideológica

Quando um estudante opta pela militância ele deve ter consciência de que esta atividade demanda tempo, estudo e disposição. Além das atividades de sala de aula, de um possível estágio ou emprego, das relações com a família, enfim, das atividades cotidianas, o militante deve estar preparado para formular e fazer debates. Bárbara considera que o estigma que por vezes cai sobre o movimento estudantil, de que “militante é a galera que não quer saber de estudar, só quer saber de criticar” deveria ser o contrário. Ela, por exemplo, mesmo envolvida na militância está concluído o curso sem atrasos – entrou na UFS em 2008 e está saindo no segundo período de 2011.

Tendo como base de formação o marxismo, a estudante acredita que Marx ajuda a compreender “os mecanismos violentos e brutais do sistema capitalista”. Além do teórico alemão, ela destaca dentre suas leituras o pernambucano Paulo Freire, por considerá-lo um autor que, quando lido, causa indignação, mas também motivação para construir transformações. Dessa forma a estudante vai buscando leituras que também ajudem a compreender questões mais específicas como a democratização da comunicação. A exemplo, Vinícius de Lima (UnB), César Bolaño (UFS) e outros vêm suprir essas demandas.

Rompendo com a tendência à partidarização que vem ocorrendo dentro dos movimentos sociais – inclusive no movimento estudantil –, Bárbara não é filiada a nenhum partido político. A estudante considera a filiação um processo importante, e acredita que participar do movimento estudantil não a impede de filiar-se. No entanto, diz ainda não ter encontrado dentro de seus estudos vivências de movimentos e linhas partidárias com as quais se identificasse a ponto de desejar defendê-las.

Expectativas e Projetos

Uma das preocupações da jovem militante é o fato de que fora do ambiente universitário os espaços de discussão alternativa são restritos. Em Sergipe, por exemplo, a comunicação de esquerda limita-se a assessorias de comunicação de alguns sindicatos. Neste sentido, ela compreende que por mais que haja discordância das linhas e mecanismos ideológicos dentro dos veículos de comunicação hegemônica, terá que lidar com eles enquanto profissional: “a gente vai precisar passar, por ventura, por uma redação, mas isso não nos impede de militar”.

Uma das apostas de Bárbara para perpetuar a militância é o Fórum Sergipano pelo Direito à Comunicação. Este fórum é composto por entidades tais como ABRAÇO - Asssociação Brasileira de Rádios Comunitárias em Sergipe; MMM - Marcha Mundial das Mulheres; ENECOS - Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social; dentre outras. Passando atualmente pelo processo de conclusão de estatuto e composição de coordenação, o fórum será organizado através de eixos temáticos e tem como objetivo trazer para a sociedade o debate da compreensão da comunicação como um direito.

A ocupação

Até o momento da postagem dessa matéria os estudantes permaneciam na ocupação. Além da anti-sala, a ação estendeu-se à assessoria de comunicação da universidade (Ascom). Segundo os estudantes que integram o processo, a mobilização vai além do caráter pontual, uma vez que se volta a melhorias que beneficiariam não só os estudantes de agora, mas os que ingressarem futuramente na universidade.

Neste sentido, Bárbara contextualiza: “A gente vive um quadro para além de apatia, um quadro de individualismo que não é à toa. Ele vem de uma lógica de sistema que ressalta o tempo todo a competitividade, a questão do eu, e que não consegue compreender a importância do ser coletivo. E isso, de algum modo, não é culpa das pessoas, não é culpa dos estudantes não estarem participando desse processo.” E completa: A nossa idéia enquanto movimento é tentar mostrar aos estudantes outros valores, outras lógicas. Um dia já fomos cinco, agora já somos dez, aqui já somos 50, às vezes durante o dia somos 100 ou 200. E a gente tem conseguido. Convencer a sociedade de que aquilo pelo que estamos lutando é correto é, até, fácil. Mas, chamar o ‘camaradinha’ e a ‘companheira’ para construir junto com a gente é mais difícil. Mas é gratificante porque temos muita consciência de que a nossa pauta é necessária.”

Mais informações sobre a ocupação:

http://chegademigalhas.blogspot.com
@Comunicaufs

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